segunda-feira, 20 de julho de 2009

Cristãos perseguindo cristãos


INTERNACIONAL - Esta é a terceira parte do artigo intitulado Perseguição e missão, escrito por Thomas Schirrmacher para Lausanne World Pulse. Leia a primeira, a segunda e a terceira parte.

Profetas e verdadeiros cristãos sempre foram perseguidos por autoridades institucionalmente religiosas. O próprio Israel perseguia os profetas do Velho Testamento, Jesus e até os apóstolos.

Jesus comparou os líderes espirituais de seus dias com aqueles assassinaram os profetas do Velho Testamento (Mt 5.10-12, 23; 23.21,34; Lc 11.49; 13.34; 21.12, Jo 5.16. Veja também Estevão em At 7.52; Pedro em At 2.23 e Paulo em 1Ts 2.14-15).

Existem cristãos hoje que também perseguem tanto cristãos quanto outros. Basta nos lembrarmos das conversões forçadas que aconteceram na Idade Média, a colonização da América Latina, as Cruzadas, a opressão aos hereges, a Inquisição e o massacre dos judeus. Desde o século IV, o termo “mártir” foi utilizado para incluir cristãos assassinados por outros cristãos “ortodoxos”.

O fato de que os cristãos são martirizados por eles mesmos no nome do Deus cristão, por mais terrível que seja, não é algo externo às Escrituras. Nenhuma outra religião possui um livro santo que descreve seus seguidores tão negativamente quanto a Bíblia faz com o povo de Israel e com os cristãos. Essa autocrítica honesta e algumas vezes severa é integral tanto para o judaísmo quanto para o cristianismo, em contraste com outras religiões.

O Estado, política e perseguição

Devemos evitar definir perseguição em termos simplesmente religiosos, já que ela pode surgir quando os cristãos tomam certas posições políticas e éticas.

"Teologias recentes, como a teologia católica da libertação, às vezes, aplicaram a terminologia “mártir” a mártires políticos e combatentes de resistência.

De fato, é correto dizer que, às vezes, a perseguição tem real aspecto político, especificamente quando a censura de governantes inicia a perseguição.

Há uma longa tradição de censura política que gera perseguição desde os profetas do Velho Testamento até Atanásio, Tomás Becket, Dietrich Bonhoeffer, Martin Luther King e o arcebispo Oscar Romero. Os cristãos são normalmente cidadãos leais que buscam o bem-estar de seu Estado, país e povo. Mas, sempre que o Estado tenta forçá-los a desonrar a Deus e especificamente suprimir o cumprimento de sua missão, eles devem obedecer a Deus e não a humanos (At 4.19; 5.29)

É claro que é difícil supor exatamente qual deve ser a extensão de nossa cooperação com o governo durante períodos de perseguição, e quando devemos resistir. Nas missões mundiais, essa questão deve ser decidida mais uma vez pelos cristãos em cada contexto. De fato, precisamos avaliar a possibilidade de quebrar leis estatais e resistir aos poderes pelo bem do evangelho.

Pedro e os apóstolos pregaram o evangelho a despeito das proibições estatais (At 4.19-20; 5.29) e, freqüentemente, foram presos e punidos por isso (At 12.1-2).

Em meio à oposição romana, os cristãos referiam-se a Jesus como “Senhor” (no grego, “kyrios”) e rei (em oposição ao decreto imperial, veja At 4.12; 17.6-7). Eles seguiram os exemplos do Velho Testamento (como Daniel em Dn 3; os sacerdotes em 1Cr 26.18; as parteiras egípcias em Ex 1.15-20; Raabe em Js 2).

Em vez de condenar a desonestidade deles, o Novo Testamento apresenta-os como modelos de fé (Hb 11.31; Tg 2.25). Observe que tais exemplos não dizem respeito somente à idolatria ou à renúncia do evangelho, mas a qualquer transgressão da lei de Deus. Tal resistência assume, entretanto, que o Estado exigiu a transgressão da lei de Deus.

Nunca houve perseguição somente por motivos religiosos, já que sempre há uma mistura confusa de aspectos religiosos com problemas culturais e sociais. Os motivos nacionais, econômicos e pessoais podem também exercer um papel importante.

Em Apocalipse, o ódio pela Igreja cresce devido a assuntos políticos e econômicos. Outro exemplo é o artesão efésio que instiga um tumulto porque considerava o trabalho missionário de Paulo uma ameaça ao bem-estar social (At 19.23-29). Em Atos 16, Paulo e Silas foram presos após expulsarem um demônio de uma escrava adivinhadora, deixando seus donos ficaram furiosos com a perda de seus lucros (At 16.16-24).

Na verdade, não há diferença entre os que são “perseguidos por causa de sua fé” e aqueles perseguidos por sua “ajuda ativa de justiça”.

Em Apocalipse, o governo anticristão da besta oprime os santos (“que obedeçam aos mandamentos de Deus e permaneçam fiéis a Jesus”, Ap 14.12 – veja também 12.17).

Tanto a obediência aos princípios de justiça e verdade como a lealdade a Jesus igualmente provocaram o ódio.

Missões mundiais é um mandamento primário (Mt 28. 18-20) e inclui o ensino de todos os aspectos dos mandamentos de Deus. Os opressores podem usar questões sociais ou éticas como razões de sua oposição, mas a verdadeira razão é nossa fidelidade ao mandato missionário.

Os cristãos conhecem a real razão da perseguição: o mundo os odeia assim como odeia o Senhor deles (Jo 15.18), e, portanto, a perseguição será sempre intimamente relacionada à obediência missionária.

Sobre o autor

Dr. Thomas Schirrmacher é professor de ética e sociologia da religião na Alemanha e na Turquia. Ele também é presidente do Seminário Teológico Martin Bucer, representante de direitos humanos da Aliança Evangélica Mundial e diretor do Instituto Internacional da Liberdade Religiosa (Bonn, Cidade de Cabo, Colombo).

Schirrmacher tem quatro doutorados (teologia, antropologia cultural, ética, e sociologia da religião).

Tradução: Homero S. Chagas

Fonte: Lausanne World Pulse